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15 fevereiro, 2011

Democracia tem mais desaparecidos que ditadura - 6 - Número sobe para 26

No dia 27, quinze dias após o fim da publicação da série sobre os 25 desaparecidos, um novo caso, que teria ocorrido na Cidade de Goiás, após aquela publicação, foi relatado a O Popular.

Desta vez não foi manchete, mas teve chamada na primeira página. No texto, menção à comissão que seria criada para investigar os desaparecimentos, que até ontem ainda não havia sido instalada:




Rapaz some após suposta abordagem

Família diz que autônomo foi retirado de casa por homens do Genarc da cidade de Goiás

Rosana Melo

O número de pessoas desaparecidas em Goiás depois de abordagens policiais subiu para 26 desde o dia 18 deste mês, quando o autônomo Edmilson Barros da Silva, de 32 anos, foi retirado de casa, na Rua 3, no Setor Aeroporto, na cidade de Goiás, por quatro homens armados, que se identificaram como sendo policiais civis do Grupo de Repressão a Narcóticos (Genarc) do município.

Edmilson foi algemado e levado pelos quatro homens em um carro branco e nunca mais foi visto pela mulher, uma adolescente de 14 anos, e pela mãe, Ivone Carolina da Silva, de 53 anos. A jovem presenciou toda a ação e contou que os homens falaram que cumpriam um mandado de prisão contra Edmilson. "Eles não mostraram nenhum documento. Só me deram um número de telefone, dizendo que era da cadeia de Jussara, mas quando liguei, o número era de um supermercado em Itaberaí", contou a mulher de Edmilson.

Segundo ela, os homens mandaram que ele colocasse roupa rapidamente e que não precisaria levar nenhuma troca de roupa porque para onde ele ia não precisaria delas. A mãe do autônomo registrou o desaparecimento do filho no dia seguinte, na delegacia da Polícia Civil daquela cidade.

Amigos do desaparecido contaram que dias antes da abordagem, o autônomo foi abordado por uma equipe do Grupo de Patrulhamento Tático (GPT), da Polícia Militar. Os militares teriam espancado e torturado o autônomo que, após ser liberado, teria denunciado os militares.

O corregedor-geral da Secretaria de Segurança Pública, delegado Aredes Correia Pires, disse que uma sindicância foi instaurada na delegacia da cidade para apurar os fatos e que Edmilson tinha envolvimento com o tráfico de drogas e devia a outros traficantes. "Tudo indica que ele fugiu para não pagar as dívidas ou tenha sido pego por traficantes", esclarece.

O POPULAR mostrou, entre os dias 9 e 13 deste mês, através de uma série de reportagens, que o número de pessoas desaparecidas em Goiás depois de abordagens policiais entre os anos de 2000 e 2010 é maior que o número de goianos desaparecidos entre 1968 e 1979, anos mais rígidos da ditadura militar no País.

Investigações sobre ações de grupos de extermínio em ação em Goiás, que incluem mortes e desaparecimento de pessoas, estão em andamento, em caráter sigiloso, no Centro de Apoio Operacional do Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público estadual e no Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Presidência da República. Os casos são investigados, de forma pulverizada, em delegacias goianas, pelas corregedorias da Polícia Civil, Polícia Militar e da Secretaria de Segurança Pública.

Uma comissão, formada por representantes desses órgãos, igrejas e Ordem dos Advogados do Brasil, vai investigar, de forma permanente, ações de grupos de extermínio e desaparecimento de pessoas. A criação da comissão foi determinada pelo secretário de Segurança Pública João Furtado Neto.
Sociólogo aponta ações semifacistas

Rosana Melo

"A existência de um grupo de extermínio em Goiás significa, por um lado, uma ampliação do processo social de degradação humana e aumento da violência de grupos organizados, crescimento de ações semifascistas; e, por outro lado, que o Estado e a sociedade civil estão marcados pela passividade, onde o poder estatal se omite, pois teria amplas condições de desmantelar tais grupos, mas o que é impedido por seus interesses e vínculos com o mesmo, e a população por falta de auto-organização, pressão, cobrança do poder estatal, ações variadas para pôr fim a essa situação". A avaliação é do sociólogo Nildo Viana, professor da Universidade Federal de Goiás (UFG).

Segundo ele, outro fator a ser analisado é que agora a criminalidade tem avançado no espaço das instituições estatais, com o sistema policial ficando cada vez mais submetido à lógica da sociedade capitalista, "onde o dinheiro passa a ser o Deus dos deuses e o resto passa a ser apenas o resto".

Ele explica que o medo da população em relação à polícia se deve a uma longa história, marcada por abuso de autoridade, autoritarismo, impunidade e corrupção. Por isso, conta o sociólogo, os grupos de extermínio só fazem intensificar o medo já existente e bem antigo.

"Claro que, para aqueles que ainda não temiam a polícia, passam a temê-la nesse caso, pois a participação de policiais em grupos de extermínio ultrapassa qualquer vínculo com a legalidade e com o que alguns chamam de Estado de direito, o que significa que a lei deixa de ser, mesmo que de forma meramente discursiva, parâmetro para ação policial, sendo substituída pelo uso da força e das armas, a violência nua e crua".

Ligações
Nildo Viana explica que grupos de extermínio são ligados a interesses, práticas e concepções determinadas, com origem a ligações com empresários e comerciantes que contratam assassinos para liquidarem supostos criminosos existentes nos bairros, mas às vezes, isso ocorre por vingança e por ideias semifascistas.

"Existem informações sobre existência de grupos de extermínio em praticamente todas as cidades do País, com maior incidência nas Regiões Norte e Nordeste. Porém, em algumas cidades, como é o caso de Goiânia, isso nunca foi algo de grande preocupação ou evidência". O sociólogo ressalta que evitar ações de grupos de extermínio na atual sociedade é algo possível, mas bastante difícil.

"O Estado é que seria o responsável por isso, já que garantir a segurança da população é sua função, mas ele muitas vezes provoca o contrário e não executa uma punição e prevenção adequada nesse caso, inclusive devido ao envolvimento de várias pessoas de sua esfera".

Nildo Viana defende que a população deveria se organizar e pressionar o Estado a cumprir efetivamente sua função. Para ele, somente através da ação permanente e auto-organizada da população que "o Estado poderá avançar em ações de investigação, punição e prevenção, desativando tais grupos e impedindo a emergência de outros". 

07 fevereiro, 2011

Grupos de extermínio agem em Goiás

Logo após a série sobre os desaparecidos, a manchete de O Popular no dia 24 de janeiro, foi outra excelente reportagem, sobre a atuação de grupos de extermínio em Goiás ( cuja existência havia sido mencionada em matéria do Globo no mesmo dia da primeira reportagem daquela série). 

Confira a íntegra das duas matérias que compunham a reportagem:


Cidades - Denúncia leva a grupo de extermínio (MP)

Fonte: O Popular 24/01/2011

Denúncias encaminhadas nos três últimos anos à Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos revelam a existência de grupos de extermínio em ação em Goiás e em outros cinco Estados brasileiros: Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Mato Grosso e São Paulo. Em Goiás, as denúncias apontam a participação de policiais civis e militares em execuções sumárias.

As vítimas são jovens, entre 18 e 30 anos, a maioria do sexo masculino e que tinha antecedentes criminais por furto, roubo, tráfico de drogas e receptação. Todas foram mortas a tiros com armas de calibres de uso das polícias. A maioria dos tiros acertou a cabeça das vítimas.

Apesar da revelação feita pelo ouvidor Fermino Fecchio Filho, da Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, a investigação dos atos criminosos do grupo é pulverizada em diferentes inquéritos policiais e em processos que correm há anos na Justiça.

Trocas de tiros forjadas com bandidos apontados como de alta periculosidade e a execução sumária de suspeitos de cometer crimes, feita por duplas em motocicletas são algumas das ações investigadas tendo como prováveis autores policiais goianos.

Uma investigação neste sentido segue em sigilo no Grupo de Repressão ao Crime Organizado (GRC) do Ministério Público (MP) estadual e no Conselho de Defesa dos Diretos da Pessoa Humana (CDDPH) da Secretaria Nacional de Segurança Pública, da Presidência da República.

Os homicídios atribuídos aos integrantes do grupo de extermínio goiano são investigados também de forma pulverizada, em delegacias de polícia do interior, em Grupos de Investigações de Homicídios nas 14 regionais da Polícia Civil, na Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic) e na Delegacia de Investigações de Homicídios (DIH).

Integrante do CDDPH, a procuradora de Justiça Ivana Farina Navarrete Penna explica que as características das execuções praticadas pela polícia goiana são de grupo de extermínio. "São tiros certeiros no crânio, incineração de corpos, o uso de motocicletas nos assassinatos para dificultar a identificação dos autores e o desaparecimento de pessoas", disse.

No mapeamento dos grupos de extermínio em ação no Brasil investigados pelo CDDPH estão bandos de Goiás, Paraíba, Pernambuco e Ceará em atuação desde 2003, na Bahia desde o ano 2000, em Sergipe e no Espírito Santo desde 1994, no Rio de Janeiro desde 2006 e em toda a Região Nordeste do País desde 2005.

22 janeiro, 2011

Democracia tem mais desaparecidos do que ditadura - N'O Globo também

Na edição do domingo, dia  dia 9, quando saiu a primeira reportagem da série de O Popular,  O Globo também tratou dos dois temas, mas sem relacioná-los, como fez o primeiro. 

Uma das várias matérias, manchete principal, abordava a existência de grupo de extermínio no Entorno do DF. Declaração do Ministro Nélson Jobim, que estava numa outra, foi respondida em artigo publicado na edição de terça-feira, dia 11, da Folha. Confira, abaixo, clicando sobre os títulos:



Policiais comandam grupos de extermínio em todo o país, revela ouvidor de direitos humanos - O Globo Online 

Governo Dilma quer aprovação da Comissão da Verdade para identificar torturadores - O Globo Online 

Jobim diz reconhecer resistência 'minoritária' contra apuração de crimes cometidos na ditadura - O Globo Online 

Comissão da Verdade: coronel da reserva não crê em 'caça às bruxas' - O Globo Online  

Ex-companheiros de Dilma relembram tristes momentos na VAR Palmares - O Globo Online 

Dois Demônios - por Vladimir Safatle - Folha, 11/01/11  

21 janeiro, 2011

Democracia tem mais desaparecidos do que a ditadura - 4 - Repercussão da entrevista

Na edição de domingo, dia 16, O Popular publicou comentários do sociólogo Dijaci David de Oliveira, professor da UFG,  e de alguns populares sobre a entrevista do Secretário de Segurança Pública, João Furtado de Mendonça Neto, publicada na véspera (destaques em azul meus):

Especialista diz que ideias devem ser concretizadas

 Repensar o conceito de segurança. Com essa ideia principal, o secretário de Segurança Pública de Goiás, João Furtado Neto explicou ontem, no Face a Face, canal interativo do POPULAR, como pretende trabalhar na diminuição da letalidade policial e da violência e criminalidade no Estado. Para o sociólogo Dijaci David de Oliveira, da Universidade Federal de Goiás, a ideia de repensar uma polícia é boa, porque percebe-se que a polícia não tem uma proximidade com a sociedade e é suspeita até de ações ilegais, como o desaparecimento de pessoas. "Não acreditar na existência de um grupo de extermínio na polícia é uma opinião pessoal, mas anunciar a criação de uma comissão para investigar os casos, tem de dizer que autonomia essa comissão terá", disse.

Segundo o sociólogo, não ficou explicado como vai funcionar a comissão criada para acompanhar os desaparecimentos após supostas ações da polícia. "Vai ser uma ouvidoria, uma corregedoria?", questiona.

 Dijaci de Oliveira defende que um diálogo com a sociedade civil organizada seja um bom caminho para o combate à criminalidade e sugere que o secretário tenha um diálogo com a área da educação. Ele acredita que apoiar instituições de ensino que adotam políticas de combate à intolerância já é um importante passo para esse objetivo. (clique aqui para ler na íntegra).

 

Democracia tem mais desaparecidos do que ditadura -3 - Secretário de Segurança Pública é entrevistado

Após a série de reportagens sobre os desaparecidos, publicada de domingo a quarta-feira, o entrevistado da semana no Face a Face foi o Secretário de Segurança Pública, João Furtado de Mendonça Neto. 

Entrei no Facebook quando o jornal criou essa ferramenta. Pude observar, à época,  seguindo os comentários, que era uma inovação que partira do CEO da OJC, Fernando Portella. Como ele está deixando a empresa, não vejo sentido em manterem o formato e essa entrevista só comprova isso.

O único ponto positivo no formato é permitir ao público fazer perguntas ao entrevistado. Atualmente, os usuários do Facebook fazem perguntas ao longo da semana, na sexta-feira o entrevistado responde e no sábado a entrevista é publicada. No entanto, como é uma plataforma externa , se quem perguntou não for assinante ou não comprar o jornal, sequer verá a resposta dada, já que o conteúdo não é publicado no Facebook. Qual o sentido então de restringir a partipação a esta única plataforma ( perguntas enviadas por  e-mail, salvo engano, são incluídas no Facebook pela redação). Mas e o twitter (onde em Goiás há muito mais discussão política),  o telefone, o correio, o fax, e o que mais aparecer por aí? 

No aspecto jornalístico, é muito confortável para o entrevistado. Primeiro, não há surpresa nas perguntas, que ele pode acessar enquanto vão sendo formuladas, se preparando calmamente. Segundo, como não há réplica, esses dois pontos acabam neutralizando o ponto positivo da liberdade em perguntar: a resposta pode fugir do que foi perguntado e fica por isso mesmo,  convertendo-se numa variação do jornalismo declaratório.

Manter a liberdade do público perguntar, mas com os jornalistas cobrando as  respostas e também participando, com questões em primeira mão: esse seria um Face a Face muito melhor.
Para exemplificar, duas respostas dadas na entrevista mencionada acima (leia na íntegra clicando aqui). Imaginem como seria no formato que sugiro, com os jornalistas interferindo (destaques em azul meus):

Walter Costa – O senhor afirmou que aumentará em 25% o efetivo da PM, que é o ideal e o necessário, mas a Polícia Civil também não terá seu efetivo aumentado?


O aumento será gradativo. Temos uma diretriz do governador de não fazer concurso neste ano até que se coloque a casa em ordem e também porque recentemente houve uma nomeação excessiva de servidores efetivos e está havendo uma dificuldade em relação a isso. Há também um grande quantitativo de cargos temporários. Estamos acompanhando o planejamento do governo e vamos tentar nos adequar a ele. Mas vamos aumentar o efetivo da polícia, da PM em primeiro lugar porque é ostensiva. Produz efeito quando está presente no seio da comunidade. Se a polícia está presente nos bairros, a tendência de você sofrer um evento perigoso é menor. A PM funciona ostensivamente, precisa circular pelo Estado todo. Hoje a gente está com um conceito de polícia comunitária que exige mais gente ainda. Polícia tem de estar próxima da família, tem de defender o cidadão, tem de defender a saúde pública, retirar o crack e o traficante das ruas.
 
Então, vamos aumentar o efetivo da PM porque está defesado. A população aumenta, aumenta a necessidade de policiais. Muitos policiais se aposentam, outros vão para reserva ou morrem. No caso da Polícia Civil, temos de fazer o mesmo trabalho de reposição do efetivo, mas os porcentuais não são semelhantes, são menores.


Luciana Brites – Policiais e jornalistas que vão investigar e cobrir crimes supostamente cometidos por policiais e a existência de grupos de extermínio terão alguma proteção especial? É comum delegados e repórteres sofrerem ameaças e todo mundo tem medo de morrer. O Estado tem alguma proteção específica para essas categorias?


Eu espero que não seja preciso este tipo de proteção. Montamos uma comissão bem plural, com pessoas de diversos segmentos da sociedade e também de instituições policiais, justamente para oferecer o suporte que elas precisam para trabalhar. Não é uma comissão investigativa, isso é papel da polícia, mas para preparar um relatório com base no que está acontecendo, o que aconteceu e apresentar para a sociedade para dar transparência dos fatos. Essa comissão não vai se envolver com pessoas em situação de risco.

Democracia tem mais desaparecidos do que ditadura - 2 - Jornalistas comentaram a série

A série de O Popular teve repercussão na imprensa goiana (na TV, aparentemente foi ignorada):


1) No semanário Jornal Opção, Euler Belém, editor do jornal e único jornalista de Goiás que consta como fonte da obra de Elio Gaspari sobre a ditadura militar, comentou a série em sua coluna  Imprensa. Identificou uma  facção na PM que age fora da lei , "instituiu a pena de morte no Estado" e é "muito influente". Ao final, se mostra esperançoso quanto ao novo Secretário de Segurança Pública mudar o quadro.


No texto principal da coluna, tratou da história e violência da máfia italiana, incluindo sua ramificação dentro do aparelho estatal e citou o provébio siciliano que personifica a omertà, a lei do silêncio “aquele que é cego, surdo e mudo viverá cem anos em paz”. A nota completa era:

Polícia institui pena de morte em Goiás

Há duas “instituições” na Polícia Militar de Goiás. Uma, composta pela maioria dos policiais, é séria e respeita as leis. Outra, ainda que minoritária, é muito influente e comporta-se como se fosse PM, Polícia Civil, Ministério Público e Judiciário. Essa facção, que comporta-se como se fosse um esquadrão especializado em assassinatos, investiga, prende, denuncia e condena. O grupo instituiu a pena de morte no Estado. No domingo, 9, a repórter Rosana Melo, do “Pop”, publicou uma matéria que mostra, detalhadamente, que o número de pessoas que desapareceram (25) depois de abordagem policial é maior do que o número de desaparecidos políticos (quinze) no tempo da ditadura civil-militar. É possível que o dado esteja subestimado.
O secretário de Segurança Pública, João Furtado, tem autoridade para mudar este quadro. Porque, além de jurista, de apostar no Estado de Direito, é um humanista.
( a coluna não tem link direto. Acesse jornalopcao.com.br, clique em colunas e  a seguir em Imprensa)

2. Eduardo Horácio, jornalista e professor universitário, entre outras coisas, mas acima de tudo independente, autor do blog Jornal X, elogiou a série em seu perfil @jornalx no twitter:

Em tempo: reportagens de Rosana Melo em O Popular são o q de melhor o jornalismo goiano produziu nos últimos anos http://tinyurl.com/6bfkrd4

10 janeiro, 2011

Democracia tem mais desaparecidos do que ditadura -atualizado

Imperdível e histórica a série de reportagens de Rosana Melo que O Popular publica desde ontem.

Primeira parte - 09/01: Democracia tem mais desaparecidos do que ditadura



O número de desaparecidos em Goiás após abordagem policial nos últimos dez anos é maior que o de goianos desaparecidos políticos durante o regime militar. Este é o resultado de um levantamento do POPULAR em quatro fontes: a Divisão de Pessoas Desaparecidas (DPD) da Delegacia de Investigações de Homicídios da Polícia Civil, a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Goiás, a Corregedoria da Polícia Militar e o Centro de Apoio Operacional de Controle Externo da Atividade Policial, do Ministério Público.


A pesquisa revela que 23 pessoas nunca mais foram vistas após abordagem da Polícia Militar entre 2000 e 2010. Durante os anos mais duros do regime militar, entre 1968 e 1979, 15 goianos desapareceram.

O sumiço de pessoas em plena democracia quase sempre teve o mesmo padrão: as vítimas foram abordadas em locais públicos e na presença de várias testemunhas. Muitos dos desaparecidos entre 2000 e 2010 cometiam pequenos delitos e foram abordados como suspeitos pela PM.
(clique aqui para ler a íntegra)
O Popular - Desaparecidos


Segunda parte - 10/01: A espera sem fim das famílias dos desaparecidos da democracia


Nas três últimas semanas, O POPULAR tentou localizar as famílias das vinte e três pessoas desaparecidas após abordagens policiais entre os anos de 2000 e 2010 em Goiás. Algumas, com medo de represálias por parte dos suspeitos, preferiram não falar. Sete aceitaram contar seus dramas. Uma coisa em comum entre elas: a revolta pela falta de respostas sobre o sumiço de seus filhos.
(  clique aqui para ler a íntegra)




Terceira parte - 11/01: Sobe para 25 o número de pessoas desaparecidas após ação da PM

Sobe para 25 o número de pessoas que desapareceram depois de abordagens da Polícia Militar em Goiás. Durante três semanas, O POPULAR pesquisou o tema em quatro fontes diferentes: na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, na Polícia Militar, na Divisão de Pessoas Desaparecidas da Delegacia de Investigações de Homicídios e no Centro de Apoio Operacional do Controle Externo da Atividade Policial do Ministério Público.

A conclusão da pesquisa, publicada na edição de domingo e ontem do POPULAR, foi a de que mais pessoas desapareceram em Goiás após abordagens da PM entre 2000 a 2010 do que entre 1968, quando foi redigido o Ato Institucional número 5 (AI-5), e 1979, quando o último presidente militar, João Batista Figueiredo, promulgou a Lei da Anistia. No período, oficialmente, 15 goianos desapareceram.

O número de desaparecidos na última década subiu de 23 para 25 pois ontem a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Goiás teve acesso a documentos da Corregedoria da Polícia Militar e da Justiça de Alvorada do Norte, em que outras duas pessoas foram dadas como desaparecidas após ação da PM.(clique aqui para ler a íntegra)


SSP anuncia criação de comissão para investigar desaparecimentos

Em entrevista ontem, durante a posse de desembargadores do Tribunal de Justiça, o secretário de Segurança Pública, João Furtado Neto, disse que dará uma solução imediata para a sociedade em relação aos desaparecimentos de pessoas depois de abordagens da Polícia Militar.
(clique aqui para ler a íntegra)

Quarta parte - 12/01: Defensoria apura desaparecimentos

A Defensoria Pública da União abriu processo administrativo para apurar como foram feitas as investigações sobre os 25 desaparecimentos de pessoas ocorridos após abordagens policiais entre os anos de 2000 e 2010. A denúncia, feita na série de reportagens que o POPULAR publica desde domingo, revela que mais pessoas desapareceram em Goiás no período que entre os anos de 1968 e 1979, fase mais conturbada do regime militar brasileiro.

Segundo Adriano Cristian Souza Carneiro, do Ofício de Direitos Humanos e Tutela Coletiva da Defensoria Pública da União em Goiás, a intenção da instituição é pressionar os órgãos estaduais para que façam investigações que apresentem resultados. "O que nos parece é que falta eficácia nas investigações destes casos. Se, no processo administrativo, a Defensoria Pública da União entender que houve ineficácia, poderemos propor a federalização das investigações sobre os desaparecimentos após abordagens da PM em Goiás", explicou. (clique aqui para ler a íntegra).

27 outubro, 2010

STJ acolhe pedido de federalização pela primeira vez!

Hoje é um dia histórico para os direitos humanos no Brasil: o STJ acolheu o pedido do Ministério Público Federal para federalizar a investigação do homicídio de Manoel Matos.

Leia a matéria de Rodrigo Martins, do site da Carta Capital:

Fim da impunidade na fronteira do medo

STJ autoriza a federalização do assassinato de Manoel Mattos (foto). Esta é a primeira vez que um caso será deslocado da justiça estadual para a federal no Brasil. Por Rodrigo Martins

Por cinco votos a dois, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, na quarta-feira 27, federalizar a investigação do assassinato do advogado e vereador do município de Itambé (PE) Manoel Mattos, executado no litoral da Paraíba em janeiro do ano passado. Além deste homicídio, a Polícia Federal também ficará incumbida de averiguar outros crimes relacionados à execução, atribuída a um grupo de extermínio que atua na divisa entre Paraíba e Pernambuco. De acordo com organizações civis que acompanham a situação na chamada “fronteira do medo”, este esquadrão, integrado por policiais, seria responsável por ao menos 200 mortes nos últimos dez anos. Muitos dos casos nem sequer tiveram boletim ocorrência registrado ou inquérito instaurado.

Reconhecido defensor dos direitos humanos, Mattos denunciava os crimes na região e passou a sofrer ameaças. Chegou a ter proteção de agentes da Polícia Federal, graças a uma recomendação feita pela Organização dos Estados Americanos (OEA) em 2002, mas passou os últimos dois anos de sua vida sem a escolta, interrompida pelo governo. Em 8 de setembro, o STJ iniciou o julgamento do pedido de federalização com o voto favorável da ministra relatora Laurita Vaz. A audiência acabou suspensa graças ao pedido de vistas de Celso Limongi.


(clique aqui para ler a íntegra)

02 outubro, 2010

TSE derruba decisão do TRE-GO e nega registro a Batista Pereira -2 A história da condenação

Em setembro, quando o Ministério Público Eleitoral pediu a negação do registro da  candidatura de Batista Pereira,  o Correio de Uberlândia  recapitulou a história da condenação dele por fatos ocorridos quando era vereador na cidade (também foi cassado). O jornal tentou falar com o candidato para a matéria, mas não conseguiu.

O caso é interessante por serem raras punições em ações  dessa natureza e é exemplificativo do longo caminho a ser percorrido até a condenação. Tudo para assegurar o respeito à presunção de inocência do acusado e a ampla defesa. Coisa que não se vê nos programas policiais da televisão. Abaixo, um trecho da matéria:

O indeferimento foi baseado na condenação criminal do apresentador quando ele exerceu o cargo de vereador em Uberlândia na década de 1990. A condenação pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) ocorreu em 21 de setembro de 1999. Ele foi condenado pela prática de crime de peculato continuado, definido como apropriação indevida de dinheiro público, conduta prevista no artigo 312 do Código Penal. Batista Pereira foi vereador pelo PDS entre 1993 e 1995, quando foi cassado.
Segundo a documentação encaminhada pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais à Procuradoria Eleitoral de Goiás, o candidato foi condenado a três anos de reclusão pela 3ª Câmara Criminal nas esferas criminal e cível mineira. Na ocasião, o então vereador uberlandense Batista Pereira foi considerado culpado pela prática de crime contra a administração pública.
Segundo o acórdão do TJMG, o vereador foi a Belo Horizonte para realizar serviços relativos à Câmara Municipal e adulterou notas fiscais da viagem para posterior prestação de conta e recebimento de verba indenizatória. Em um dos casos, apesar de o vereador ter ido de avião para a capital mineira, ele apresentou notas de um posto de combustível da cidade de Luz, na região Centro-Oeste mineira. Segundo o TJMG, a prática aumentou “demasiadamente os valores que recebia".
Na oportunidade, Batista Pereira afirmou que a nota do posto de combustível havia sido apresentada por um assessor.

Clique aqui para ler a notícia completa, no Correio de Uberlândia.

Brasil tem chance histórica de romper legado de abusos, diz Anistia Internacional

da BBC Brasil

Brasil tem chance histórica de romper legado de abusos, diz Anistia Internacional

Rogerio Wassermann
Da BBC Brasil em Londres

Para se tornar um país desenvolvido, o Brasil deve aproveitar a "chance histórica" de aliar o forte crescimento econômico e a estabilidade política ao enfrentamento do legado de desigualdade, discriminação e violações de direitos humanos dos cidadãos mais pobres, na avaliação do indiano Salil Shetty, secretário-geral da Anistia Internacional.
Shetty assumiu a direção da ONG de defesa dos direitos humanos em julho deste ano, após servir por quase sete anos como diretor da Campanha do Milênio das Nações Unidas, para a redução da pobreza no mundo.
Ele é uma das personalidades ouvidas pela BBC Brasil para a série "O Que Falta ao Brasil?", que discute os desafios do Brasil para se tornar um país desenvolvido.
“Uma agenda doméstica clara de respeito aos direitos humanos fundamentais para todos os cidadãos brasileiros pode se traduzir no Brasil tendo um papel de liderança internacional, promovendo os direitos humanos globalmente ao contribuir com suas experiências únicas como uma economia emergente num mundo em rápida transformação”, afirma Shetty.
Para ele, “o novo governo do Brasil precisa desenvolver os esforços prévios para combater a desigualdade por meio de esquemas de transferência de renda como o Bolsa Família”. “Ele precisa se engajar com os esforços da vibrante sociedade civil e dos grupos de base que estão na vanguarda da luta por uma sociedade mais justa.”
Para o secretário-geral da AI, no entanto, o próximo governo deve fazer ainda mais. “A reforma das instituições que ainda têm a marca da era autoritária – em particular a polícia e o sistema prisional – é urgente. Apenas resolvendo a impunidade por tortura, maus tratos e execuções sumárias por agentes do Estado é que o Brasil vai começar a resolver sua crise de segurança pública”, diz.
Shetty afirma que, no longo prazo, as autoridades de todos os níveis – municipal, estadual e federal – devem investir pesadamente em comunidades marginalizadas, levando para elas serviços públicos, incluindo habitação, saúde, educação e policiamento “profissional e responsável”.
Ele pede ainda que o próximo governo se comprometa com a demarcação de terras indígenas e com a reforma agrária e que garanta a segurança dos grupos que lutam pelo acesso à terra.
“Apesar de apresentar claras oportunidades, o forte crescimento do Brasil contém alguns perigos”, afirma Shetty.
“Questões já foram levantadas sobre o programa de crescimento econômico (PAC), com comunidades pesqueiras e grupos indígenas sendo ameaçadas de expulsão e ativistas ambientais sendo alvos de ataques. A modernização da infraestrutura é essencial, mas se o Brasil quer realizar seu grande potencial, isso não pode ser conseguido às custas dos direitos humanos”, diz.


TSE derruba decisão do TRE-GO e nega registro a Batista Pereira - atualizado


02 de outubro de 2010 - 00h35

TSE nega registro de candidato a deputado estadual em Goiás

Por 4 votos a 3, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou, na noite desta sexta-feira (1º), o pedido de registro de candidatura de João Batista, que concorre a deputado estadual em Goiás pelo PR. Ele foi enquadrado em dispositivo da Lei da Ficha Limpa que torna inelegível, por oito anos, políticos condenados por crime contra a administração pública (artigo 1º, inciso I, alínea “e”, nº 1).

A maioria dos ministros entendeu que não há qualquer ilegalidade no fato de o novo dispositivo legal aumentar o prazo de inelegibilidade de três para oito anos. Como Batista cumpriu a pena em março de 2003, pela regra original da Lei de Inelegibilidade ele ficaria impossibilitado de se candidatar até 2006. O novo prazo da Lei da Ficha Lima o tornou inelegível até 2011.

O ministro Aldir Passarinho Junior afirmou que, no caso, regra da Lei da Ficha Limpa “não constitui sanção ou pena”.  Ele explicou que uma condenação criminal não pode declarar inelegibilidade. “Portanto, entendo que não há ofensa à coisa julgada nesse caso”, concluiu. Ele apresentou seu voto-vista.

Como contraponto, citou a alínea “d” da Lei da Ficha Limpa, que amplia o prazo de inelegibilidade para condenado pela Justiça Eleitoral. O entendimento majoritário do TSE é de que esse dispositivo não pode retroagir para alterar condenações da Justiça Eleitoral que decretam uma sanção de inelegibilidade.

“No caso dos autos, o que há é uma condenação criminal cuja sanção nada tem a ver com a inelegibilidade em si”, explicou o ministro Arnaldo Versiani.

Além de Versiani, Aldir Passarinho Junior foi seguido pela ministra Cármen Lúcia e pelo ministro Ricardo Lewandowski.

O entendimento do relator do processo, ministro Marcelo Ribeiro, foi outro. Para ele, a regra da nova lei “pega uma situação completamente consolidada no regime anterior” para ampliar o prazo de inelegibilidade para oito anos. Também votaram assim os ministros Marco Aurélio e Hamilton Carvalhido.

Batista foi condenado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) por crime contra a administração pública (peculato). Ele foi acusado de falsificar notas fiscais e recibos para se apropriar de dinheiro público quando foi vereador de Uberlândia. 

Processo relacionado: RO 406971

RR/LF

Atualização em 10.10.10: No dia 6, o TSE rejeitou o recurso (embargos de declaração) de Batista Pereira. A decisão tornou-se definitiva ( transitou em julgado) ontem. Clique aqui para ouvir o registro em áudio da sessão do dia 1º que negou o registro ao candidato. 

24 setembro, 2010

23/09/2010 - MP aciona comando da PM, Fundação Tiradentes e outros envolvidos em irregularidades nos concursos promovidos na corporação

Do site do MP-GO

A promotora de Justiça Villis Marra propôs ação civil pública contra o comandante-geral da Polícia Militar de Goiás, Carlos Antônio Elias e o diretor-presidente da Fundação Tiradentes, Elói Bezerra de Castro Neto, por ato de improbidade administrativa. Também respondem à ação o coronel da PM Adailton Vieira de Lima e o servidor estadual Waldenor Alves de Sousa Filho.

Todos estão sendo responsabilizados por irregularidades nos concursos internos da Polícia Militar do Estado de Goiás, denominados Curso de Habilitação no Quadro de Oficiais Auxiliares (CHOA), Teste de Aptidão Profissional (TAP).

CHOA

Segundo a promotora, em fevereiro deste ano, a PM regulamentou o concurso interno para o CHOA, para preenchimento de 80 vagas, constituído de quatro fases: prova de conhecimentos, exames de saúde e avaliação psicológica, Teste de Avaliação Física (TAF) e análise da situação jurídica e disciplinar dos candidatos.

A primeira fase, de caráter classificatório e eliminatório, foi aplicada pela Fundação Tiradentes, contratada sem licitação pela PM.

De acordo com a portaria do concurso, deveriam ser convocados para a segunda fase, 50% (40) a mais da oferta (80), totalizando 120 canditatos. Entretanto, foram convocados 130 candidatos, dez a mais do previsto no edital. A segunda etapa e as demais foram realizadas pela própria PM. 

O TAF teve seus critérios alterados dois dias antes de sua aplicação e avaliação. Assim, foram levadas ao MP, no dia 17 de março, as seguintes irregularidades: irrecorribilidade do resultados das fases posteriores à prova de conhecimento, inobservância do princípio da vinculação ao edital, falta de explicação dos critérios para apuração das notas e desempate, irregularidades na aplicação da prova objetiva.

TAP

Para a organização e execução do Teste de Aptidão Profissional (TAP), a PM contratou, novamente, mediante dispensa de licitação, a Fundação Tiradentes. Outra representação foi feita ao MP, noticiando a venda de gabarito da prova do concurso interno, realizada em março de 2010. Houve também a notícia de que um soldado teria confessado à Corregedoria da PM a venda do gabarito em Goiânia e outras cidades do interior. Sindicância do órgão terminou na prisão de três PMs envolvidos no esquema. O comando da PM, então, anulou a prova aplicada em 7 de março e remarcada para o dia 28 do mesmo mês.

Divulgadas, inclusive pela imprensa, as irregularidades, o MP recomendou a suspensão do CHOA e TAP. Não acatando a decisão, a segunda prova do TAP foi aplicada no dia 28 de março, sem que houvesse sido apresentada qualquer conclusão sobre a venda do gabarito que acarretou na anulação da primeira prova.

Sobre a venda do gabarito (TAP), foi apurado que o soldado Waldenor de Souza Filho adquiriu gabarito da prova de conhecimento por R$ 5 mil para se beneficiar, bem como comercializá-lo no interior. O caso se alastrou e chegou ao conhecimento do coronel da PM Adailton Vieira de Lima, contratado pela fundação para ser coordenador da seleção, que também foi acionado por não ter agido com prudência e honestidade perante a confiança que lhe foi investida, além de ter sido omisso quanto às irregularidades. 

O MP pede liminar para a suspender os contratos firmados com a Fundação Tiradentes e, consequentemente, a suspensão dos resultados dos concursos realizados. No mérito da ação, pede-se a condenação por ato de improbidade administrativa. (Cristiani Honório /Assessoria de Comunicação Social)

27 agosto, 2010

Massacre sobre duas rodas

Dados do balanço da Seguradora Líder do Seguro DPVAT, divulgados ontem, mostram o massacre da motocicleta e o custo para as vítimas, suas famílias e a sociedade da economia individual no transporte sobre duas rodas (clique sobre as imagens para ampliá-las):



Outro dado interessante é quanto à judicialização do recebimento do DPVAT, em detrimento do recebimento por via administrativa, em tese mais rápido. Tema interessante para ser pesquisado: as vítimas estão sendo beneficiadas ou prejudicadas com esta prática?


24 agosto, 2010

Hélio Bicudo na Faculdade de Direito da UFG

Ontem deveria ter acontecido mais uma operação questionável na área de segurança pública: a operação integração, vulga operação limpeza, já passados um ano e meio da ilegal operação legalidade.

Violação de direitos, grupos de extermínio: cada vez mais aspectos da realidade de Goiás lembram os anos 70, em plena ditadura militar.

Coincidentemente, ontem também o jurista, político e ativista dos direitos humanos Hélio Bicudo deixou o hospital onde convalescia desde o dia 11, quando sofrera um AVC (acidente vascular cerebral).

Hélio Bicudo notabilizou-se pela coragem com que chefiou a equipe que desbaratou o Esquadrão da Morte que atuava em São Paulo, no início da década de 70, integrado, entre outros, por agentes da repressão.

Considerando a similaridade entre a gravidade da situação que já se vivia em 2007 e os anos de chumbo, ele foi o principal convidado do seminário Segurança Pública e Democracia, realizado na Faculdade de Direito da UFG, em 29 de novembro daquele ano.

Em março deste ano, ao divulgar a audiência pública promovida pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legistativa do Estado de Goiás, lembrei sua vinda a Goiânia.

cartaz do seminário (clique sobre a imagem para ampliá-la)



A despeito da relevância da palestra e do debate que se seguiu, foi pequeno o público presente. Felizmente, quase tudo foi gravado em vídeo, cuja disponibilização ao público coincide com a notícia de que ele passa bem.

Esta primeira versão contém sua palestra e os comentários que fez no debate. A versão completa será disponibilizada após a autorização dos demais participantes:


Segurança Pública e Democracia - Hélio Bicudo na UFG from NAJUP UFG on Vimeo.




Memória:

Em 2007, diante da gravidade da situação que já se vivia, denunciada inclusive em artigos do procurador da república aposentado Deusimar Rolim e do promotor de justiça Haroldo Caetano, aconteceu também na Faculdade de Direito da UFG seminário para tratar da violência, com a presença do procurador de justiça aposentado e ex-deputado federal Hélio Bicudo.

O Secretário de Segurança pública confirmou sua presença ( inclusive em nota no site do órgão), mas não compareceu. Do Ministério Público, apesar do apoio do órgão - autorização para incluir suas logomarcas e para afixação de cartazes no prédio da sua sede, esteve presente apenas o Dr. Haroldo Caetano. Três semanas antes membros do MP e outros profissionais da área haviam lotado o Cine Lumière para uma sessão com debate do filme Tropa de Elite , promovida pela instituição.

11 maio, 2010

Caso de Luziânia: e agora, sem Ademar, onde está o outro desaparecido?

Acaba de ser revelado que o primeiro rapaz desaparecido em Luziânia não está entre os seis corpos localizados no mês passado. O sexto corpo foi identificado como de Eric dos Santos, cujo desaparecimento só começou a ser investigado pela polícia em 20 de abril, um mês após seu sumiço.

Resultado de DNA supreende: primeiro desaparecido não está entre os corpos encontrados (leia aqui reportagem do Correio Braziliense desta tarde).

Ricardo Rangel, promotor de justiça de Luziânia, na segunda-feira, 19 de abril, criticando a atuação da Polícia Civil de Goiás, por ter permitido que o réu confesso Ademar de Jesus Silva se matasse (grifei):

– A morte dele traz um prejuízo irreparável para a investigação. Os exames de DNA devem ficar prontos nos próximos dias e, por hipótese, vamos considerar que algum dos corpos não seja de nenhum dos garotos desaparecidos. Se isso acontecer, quem vai esclarecer? A investigação sobre eventual participação de terceiros nos crimes também está prejudicada agora.

Três dias antes (dois antes da sua morte) , a Polícia Federal havia comunicado ao MP de Luziânia sua saída do caso, por discordar do excesso de exposição do pedreiro promovido pela Polícia Civil de Goiás, como revelou o Correio Braziliense em 30.04 (grifei):


PF deixa caso

A excessiva exposição de Ademar Jesus da Silva feita pela Polícia Civil de Goiás quando da prisão do pedreiro motivou a Polícia Federal a enviar uma carta ao Ministério Público de Luziânia comunicando o fim da parceria nas investigações sobre o caso. No documento de quatro laudas, a PF explicou que discordava das medidas adotadas pela equipe goiana desde o momento da prisão do acusado. A carta foi entregue ao MP em 16 de abril, dois dias antes do acusado ser encontrado morto em uma cela da Delegacia Estadual de Repressão a Narcóticos, em Goiânia.

No comunicado, o delegado de combate ao crime organizado da PF, Hellen Wesley Almeida Soares, critica o fato de terem sido disponibilizadas imagens de operações policiais em programas de TV, de ter sido permitido que o acusado respondesse a questionamentos da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pedofilia antes de os delegados responsáveis pelo caso colherem depoimentos formais. A nomeação da delegada Renata Schein para conduzir os depoimentos também foi classificada como uma falha, uma vez que Renata não acompanhou os três meses de investigações sobre os desaparecimentos. Hellen Wesley relata que “diante das medidas”, a PF não poderia mais continuar no caso.

Além da Polícia Civil de Goiás, sobrou para o senador Demóstenes Torres, procurador de justiça do MP de Goiás, ex- Secretário de Segurança Pública, que não resistiu aos holofotes e atropelou a investigação, descambando de Brasília a Goiânia com a CPI da Pedofilia.

Em 12.04, entrevistas de Ademar : coletiva; coletiva em versão mais longa; exclusiva à TV RECORD, , exclusiva à TV SERRA DOURADA (SBT) junto a entrevista com o delegado geral da Polícia Civil, Aredes Correia.

11 abril, 2010

Anistia - Enquanto o Supremo não decide...

Na última segunda-feira, dia 8, Frederico Vasconcelos publicou, em seu blog, o manifesto da Associação Juízes pela Democracia e do Movimento do Ministério Público Democrático do Brasil, em apoio ao juiz espanhol Baltazar Garzón.

No mesmo dia, um pouco mais tarde, noticiou que o STF julgará na quarta-feira, dia 14, a ação proposta pela OAB em outubro de 2008 em que "trata-se de saber se houve ou não anistia dos agentes públicos responsáveis, entre outros crimes, pela prática de homicídio, desaparecimento forçado, abuso de autoridade, lesões corporais, estupro e atentado violento ao pudor contra opositores políticos ao regime militar (1964/1985)". A Procuradoria da República e a AGU deram pareceres para que tudo continue como está.

Se for esta a decisão do STF, o país continuará sendo a solitária exceção a não julgar os criminosos das ditaduras implantadas entre os anos 60 e 70. Julgamentos que tiveram na atuação de Garzón um estímulo fundamental, quando pediu a extradição de Pinochet.

Enquanto aguardamos pelo STF, é uma boa oportunidade para conhecer um pouco mais a respeito do assunto:

1) Sobre o clima de "entendimento" que vivia o país à época, a entrevista do general Newton Cruz, chefe da Agência Central do SNI entre 1977 e 1983 ( a lei é de 1979), no programa Dossiê Globonews de ontem;

2) Sobre os acontecimentos nos períodos imediatamente anterior e posterior à aprovação da lei, a o material disponibilizado pela Folha sobre o governo Figueiredo, publicado à época da eleição de 2002 ( a lei é de agosto de 1979 e o AI-5 tinha sido revogado 8 meses antes, em 31 de dezembro de 1978), destacando-se os atentados promovidos pela linha dura do regime;
- Sobre os atentados à OAB, à Câmara Municipal e a um jornal, no Rio de Janeiro, em agosto de 1980.

3) Sobre como o passado não resolvido se reflete na continuação do uso da tortura no presente, tendo como vítimas os pobres, artigo de Maria Inês Nassif, no Valor;

4) No mesmo sentido, trecho do comunicado da Anistia Internacional, por ocasião da divulgação do Plano Nacional de Direitos Humanos:

O ponto central do novo programa é a importante inclusão do direito à memória e à verdade, com a promessa da formação de uma comissão para apurar e divulgar os crimes contra os direitos humanos cometidos pelo regime militar do país.

A Anistia Internacional afirmou que espera que esta comissão venha a finalmente alinhar o Brasil aos outros países da região, que há muito tempo se esforçam para julgar os responsáveis por crimes como desaparecimento, tortura e execução extrajudicial, assegurando assim que as famílias das vítimas gozem do direito à reparação.

O legado de impunidade de crimes passados contra os direitos humanos perdura nos relatórios diários de mortes causadas pela polícia e casos de tortura que hoje caracterizam o sistema de justiça criminal do Brasil.



5) Trecho do comunicado do Human Rights Watch, de abril do ano passado, logo após decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso da Guerrilha do Araguaia:

(Washington, DC) - O Brasil deve investigar e levar a julgamento as violações aos direitos humanos cometidas durante a ditadura de 1964-1985 após uma decisão judicial histórica, afirmou a Human Rights Watch hoje. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos afirmou que anistias e prescrições não se aplicam a crimes de lesa-humanidade cometidos durante a ditadura militar no Brasil.

A conclusão da comissão, anunciada em 8 de abril de 2009, é a primeira decisão internacional relacionada aos abusos cometidos durante a ditadura militar no Brasil (1964 a 1985). A petição que deu origem à decisão foi enviada por familiares de 70 pessoas desaparecidas durante operações militares contra o movimento comunista de guerrilha do Araguaia nos anos 70.

"O Brasil não promoveu julgamentos e nem mesmo instaurou uma comissão da verdade para apurar os crimes muito graves que foram cometidos, e está atrasado em relação a outros países da região no que diz respeito à responsabilização por abusos do passado", disse José Miguel Vivanco, diretor da divisão das Américas da Human Rights Watch. "Quase um quarto de século já se passou desde a transição para a democracia. As vítimas e suas famílias já esperaram demais por justiça."

6) Trecho de palestra de Noam Chomsky em Stuttgart, na Alemanha, em 23 de março, em tradução minha:

Cuba à parte, a praga do terror de estado no hemisfério ocidental foi iniciada com o golpe brasileiro em 1964, instalando o primeiro de uma série de Estados de Segurança Nacional neonazistas e iniciando a praga da repressão sem precedentes no hemisfério, sempre fortemente apoiada por Washington, e por esta razão uma forma particularmente violenta de terrorismo internacional de direcionamento estatal. A campanha era em grande medida uma guerra contra a Igreja [em função do Concílio Vaticano II, iniciado em 1962]. Foi mais que simbólico que ela tenha culminado com o assassinato de seis destacados intelectuais latino americanos, padres jesuítas, em novembro de 1989, alguns dias após a queda do Muro de Berlim. Eles foram assassinados por um batalhão de elite salvadorenho, recentemente treinado na Escola de Forças Especiais John F. Kennedy , na Carolina do Norte. Como se soube em novembro último, mas aparentemente não despertou interesse nenhum, a ordem para os assassinatos foi assinada pelo chefe de governo e seus assessores, todos eles tão próximos do Pentágono e da Embaixada Americana que se torna ainda mais difícil imaginar que Washinton não tivesse conhecimento dos planos deste batalhão modelo.
7) De Jânio de Freitas, sobre a ameça de demissão dos ministros militares, no início do ano, após a divulgação do Plano Nacional de Direitos Humanos, tratando especificamente da anistia;

8) Trecho de artigo de Luiz Cláudio Cunha, repleto de dados históricos, também sobre a crise do fim do ano passado:

Na antevéspera do Natal, quando já bimbalhavam os sinos, o presidente Lula ouviu em seu gabinete um tropel distante. Não eram as renas do bom velhinho. Era o som metálico dos cascos das montarias de seu ministro da Defesa e dos chefes das Forças Armadas, em marcha batida para emparedar o presidente na mais grave crise militar da República desde 1977, quando o presidente Ernesto Geisel demitiu o então ministro do Exército Sylvio Frota, num gesto implacável e temerário para conter o radicalismo da linha-dura do regime – que no espaço de três meses matou, sob torturas, o jornalista Vladimir Herzog e o operário Manoel Filho no DOI-CODI do II Exército, em São Paulo.

Desta vez ocorre o contrário. Os comandantes militares é que tentam enquadrar o presidente da República, ameaçando uma demissão coletiva contra o decreto presidencial que cria a Comissão Nacional da Verdade, destinada a investigar violações de direitos humanos e casos de tortura durante a ditadura militar (1964-1985).

Durante duas décadas, um aparato repressivo estimado em 24 mil agentes prendeu por razões políticas cerca de 50 mil brasileiros e torturou algo em torno de 20 mil pessoas – três a cada dia.



8) Entrevista com Fábio Konder Comparato, um dos signatários da petição da OAB no STF, à Carta Capital - primeira e segunda partes.

9) Trailer e blog de Guerrilha do Araguaia, as faces ocultas da história, filme de produção goiana, exibido em rede nacional pelo programa DocTV, infelizmente não lançado em DVD.

Desaparecimentos em Luziânia - No domingo, solução do caso tem cobertura em tempo real do correspondente do Terra

Desde setembro do ano passado chamei a atenção para o diferencial de qualidade na cobertura feita pelo correspondente do Portal Terra em Goiás, Márcio Leijoto.

Em ordem cronológica invertida, citei aqui suas coberturas: da audiência pública sobre a violência em Goiás; da causa do desastre ambiental do rompimento da barragem da Usina de Espora; da briga dos cunhados de Maguito Vilela com um auxiliar seu na Prefeitura de Aparecida de Goiânia e do esquema Ponzi envolvendo pastores em Goiânia ( mais uma outra, ainda no jornal Hoje, onde foi editor, sobre a proibição na comercialização do suco de Noni).

Hoje, enviado especial do portal ao local, ele deu um show na cobertura da solução do caso dos desaparecidos de Luziânia, com a identificação do assassino confesso e a localização dos corpos.

Num dia em que não há jornalismo local na TV, praticamente esgotou o assunto nas cinco matérias que publicou ao longo do dia.

Estou curioso para ver a edição de amanhã de O Popular: o que sobrará para ser noticiado, se já sabemos tudo pelo Terra? É o tal desafio que a internet coloca para os veículos impressos.

A atuação de Leijoto como correspondente, fazendo texto e fotos, é um contraponto à crítica feita por Lourival Sant'Anna, quando lançou em Goiânia seu livro O Destino do Jornal, em relação ao "backpack journalist". Está deixando no chinelo os "grandes veículos" locais.

30 março, 2010

Judiciário interdita semiaberto -atualizado

Em fevereiro do ano passado, publiquei artigo a propósito de série de reportagens de O Popular, em que reproduzi o pedido de interdição parcial do presídio de Aparecida e a decisão que o negou.

O pedido de interdição é, de longe, o documento que mais interesse despertou de todos os que já disponibilizei: até hoje, foi lido 1.810 vezes, merecidamente.

O pedido foi feito originalmente em abril de 2008, portanto há quase dois anos.

Finalmente, a situação surreal em que se encontravam os presos, brilhantemente descrita pelo promotor de justiça Haroldo Caetano da Silva, teve uma solução.



O responsável é o juiz substituto Marcelo de Jesus, ex-professor na UFG e Faculdades Alfa e que é também engenheiro civil, profissão que exerceu antes de formar-se em Direito. Sua decisão honrou seu nome e a independência da magistratura.

Um aspecto fundamental foi destacado pelo juiz, que inclusive o repetiu para deixar isso bem claro:

Tal decisão se justifica pois são indivíduos que já estão de volta às ruas, saindo livremente do sistema carcerário durante o dia e retornando para o pernoite, sendo que a única mudança propriamente dita dirá respeito ao local de recolhimento.

Os beneficiados devem concordar com condições severas, que se infringidas implicarão na perda do benefício.


Deve ser ressaltado também que a decisão, que é temporária e excepcional, foi necessária porque nem o secretário de segurança pública, nem o estado de Goiás, intimados respectivamenente em 12 e 13 de novembro do ano passado, tomaram medidas para sanar as irregularidades nos presídios, conforme determinado pelo juízo em 23 de outubro, no prazo determinado de 120 dias (1/3 de um ano!!).

As condições dos presídios goianos, dignas da Sibéria czarista do século XIX, não sensibilizam o governo. Em 30 de dezembro, foram entregues milhares de viaturas para a polícia, num investimento de mais de R$ 82 milhões ( sendo R$ 72 milhões em locações por dois anos). Segundo o secretário de segurança, me seu discurso na entrega dos veículos, "nunca se investiu tanto em segurança":





Dois meses antes, a imprensa mostrou que o estado investira menos de 25% dos R$ 58 milhões disponibilizados pela União para a segurança pública ( dos quais pretendia gastar R$ 20 milhões com a aquisição de três helicópteros).



Segundo o juiz,

decorrido o prazo demarcado na decisão, mais especificamente no dia 12 de março de 2010, em nova visita ao estabelecimento prisional objeto do presente incidente, este Magistrado, acompanhado do Promotor de Justiça da Execução Penal, de Representante do Conselho da Comunidade e do Gerente de Segurança Prisional da SUSEPE, pode constatar, in loco, que as situações descritas na inspeção judicial (fls. 51) [em 11 de setembro de 2009] que embasaram a decisão que interditou parcialmente o presídio subsistem e, em alguns casos, se agravaram.

A superlotação é evidente, a ausência de encaminhamento de detentos para tratamento médico idem, o sistema de esgoto continua sem funcionamento, não há fornecimento regular de água, enfim, repita-se, as situações descritas na inspeção acima mencionada não se alteraram embora decorrido o prazo fixado por este Juízo.


Além disso, não há a menor segurança para os presos:

Quanto às constantes fugas tal fato é verdadeiro, em especial devido à onda de violência que ali se instalou nas últimas semanas, além do que normalmente ocorre. Os homicídios perpetrados dentro das celas do complexo do semiaberto “novo” deixaram um saldo de insegurança e aumento expressivo no número de fugas, incrementando um ciclo vicioso perverso: o indivíduo que está no semiaberto sai para trabalho externo e não volta, com medo pela própria vida; a VEP é comunicada da fuga e incontinente expede mandado de prisão; a Polícia cumpre o mandado e captura o evadido; este é ouvido em audiência de justificação e, diante da situação descrita (não cometeu nenhum fato novo, está trabalhando, não quer se envolver em qualquer problema, não quer perder a vida) acaba por ser re-incluído e, diante do quadro que encontra acaba por fugir novamente.


Esperemos que o governo agora aja com a devida rapidez para solucionar os problemas.

Abaixo, a íntegra da decisão:


Decisão Interdição Parcial


Atualização em 30 de março de 2010:

O descaso do governo fica mais evidente ainda quando se consulta a decisão anterior à qual esta se reporta, proferida em outubro de 2009 por outro juiz substituto, Alessandro Manso e Silva.

Na resposta dada ao pedido de interdição feito pelo MP, a Secretaria de Segurança Pública concentrou-se em tentar desqualificar o pedido e em dizer que não havia condições desumanas e que fazia o que podia (evidentemente sem apresentar os dados de como (não ) gasta seus recursos):

Notificada, a Secretaria de Segurança Pública apresentou parcas informações, tendo, em síntese, fixado-se no levantamento de preliminar (falta de interesse processual e conseqüente não cabimento do pedido de interdição, sobretudo por inadequação da via eleita), tocando, basicamente, o mérito - de onde se dessumem prejudiciais - no que tange à evidência de inconstitucionalidade do art. 66, VIII, da LEP (pugnando, assim, pela declaração incidental de sua inconstitucionalidade), a necessidade de preservação do princípio da Separação dos Poderes (socorrendo-se do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, com enfoque na “reserva de governo” e necessidade de manutenção na independência e harmonia dos poderes) e a inexistência de ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana (em decorrência de, na medida do possível e das inúmeras contingências próprias de um país em desenvolvimento, o Estado, por sua Secretaria, estar desempenhando a contento o seu papel).


Mais adiante, o juiz, que antes de exercer a magistratura foi professor de literatura brasileira em colégio de ensino médio de Goiânia, buscou Aluízio de Azevedo ao tratar da superlotação:


As questões relacionadas à superlotação do presídio semiaberto são visivelmente graves. As contra-argumentações, neste sentido, seriam insubsistentes, pois os fatos atestam, por si só, a situação caótica enfrentada por essa unidade de contenção da liberdade. O dado objetivo, in casu, basta. Revisito, nesse diapasão, Aluísio Azevedo, em sua clássica obra “O Cortiço”, onde expõe, com a maestria que é peculiar, a deturpação do caráter humano e uma consequente zoomorfização dos atos dos homens quando um amontoado desorganizado de gente se congrega. O desregramento surge a partir da insalubridade – entendida em variados níveis – do ambiente, provocando ações animalescas para a garantia da sobrevivência, arraigando o instinto natural de permanência.


Um pouco adiante, após descrever o restante da situação que encontrou na inspeção, corroborando o que o MP fizera em seu pedido e os relatos que presos lhe traziam , buscou Manuel Bandeira para a síntese:

Nesse aspecto, Manuel Bandeira parece muito bem se colocar quando versou “ Vi ontem um bicho/ Na imundice do pátio/ Catando comida entre os detritos (...)”.


A despeito de tudo o que viu, leu e ouviu, ainda assim o juiz concedeu o prazo para que o estado se ajustasse. Inutilmente.

A leitura da descrição da situação encontrada, na íntegra da decisão que proferiu ( assim como no pedido de interdição) , é uma transposição para a Sibéria czarista do século XIX, em pleno século XXI:


decisao_-_interdicao_do_novo_semiaberto_-_2009

19 março, 2010

Violência em Goiás - Audiência Pública - 11 - Os convites

Num dos artigos desta série, reproduzi a reportagem de O Popular em que participantes da audiência pública reclamavam da ausência da PM. Também reproduzi a matéria do dia seguinte, em que a PM dizia não ter ido porque não fora convidada, informação que não pudera ser confirmada com o deputado Mauro Rubem (grifei):

O chefe do Setor de Comunicação Social da Polícia Militar de Goiás, tenente coronel Sérgio Katayama, informou ontem ao POPULAR que a corporação não foi convidada a participar da audiência pública sobre violência policial realizada na terça-feira, no Auditório Costa Lima, da Assembleia Legislativa, por iniciativa da Comissão de Direitos Humanos da Casa. Durante a audiência, que contou com a presença do ouvidor da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Firmino Fecchio, vítimas, familiares de vítimas, organizações religiosas e da sociedade civil relataram vários casos de violência envolvendo policiais militares.

Representantes do Ministério Público Estadual, da Polícia Civil e o próprio ouvidor Firmino Fecchio, lamentaram a ausência de um representante da Polícia Militar no evento. De acordo com Katayama, caso tivesse sido convidada, a PM estaria presente para ouvir os relatos e prestar os esclarecimentos. “Gostaríamos de ter participado, mas nenhum membro do Comando Geral foi convidado”, comentou. Presidente da Comissão de Direitos Humanos, o deputado Mauro Rubem (PT) não foi localizado para comentar o assunto. Ele está em Diadema (SP) onde foi conhecer a experiência da guarda municipal.


O jornal não tocou mais no assunto, após o retorno de Mauro Rubem. Um comentário ao meu artigo estranhava a ausência de outros deputados na audiência e dizia que a Comissão de Direitos Humanos, por telefone, dissera que o convite fora feito. Pedi à comissão que confirmasse as informações. Recebi a resposta na sexta-feira:

1. Os deputado Mauro Rubem convidou os demais deputados durante sessão no plenário e também entregou convites impressos (pessoalmente, li a informação publicada com boa antecedência no site da Assembleia);

2. Os convites a autoridades são normalmente feitos por fax, cujo recebimento legível é confirmado em seguida por telefone.

Foram convidados assim o prefeito de Goiânia, que enviou como representante o sr. Osmar Magalhães; o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, de Brasília, representado pela procuradora de justiça Ivana Farina e a autoridade máxima do executivo, o governador do estado, que mandou como representante o sr. Otto Glória.

A PM e o secretário de segurança pública, subordinados ao governador, nem compareceram nem mandaram representante, mas ao contrário do divulgado, não foi por falta de convite.

Foram convidados por fax o Ten. Cel. Lorival Camargo, da corregedoria, e o Cel. Carlos Antônio Elias, comandante geral. Mas não só: outros
dois convites, ao Comando Geral e ao Secretário de Segurança Pública, foram entregues em mãos:

(clique sobre as imagens para ampliá-las)



Convite ao secretário de segurança pública, com a confirmação de entrega, com uma semana de antecedência







Convite ao Comando Geral da PM, com a confirmação de entrega, com uma semana de antecedência



Convite à corregedoria, com o nome da pessoa que confirmou o recebimento do fax





Convite ao Comandante Geral, com o nome da pessoa que confirmou o recebimento do fax