11 abril, 2010

Anistia - Enquanto o Supremo não decide...

Na última segunda-feira, dia 8, Frederico Vasconcelos publicou, em seu blog, o manifesto da Associação Juízes pela Democracia e do Movimento do Ministério Público Democrático do Brasil, em apoio ao juiz espanhol Baltazar Garzón.

No mesmo dia, um pouco mais tarde, noticiou que o STF julgará na quarta-feira, dia 14, a ação proposta pela OAB em outubro de 2008 em que "trata-se de saber se houve ou não anistia dos agentes públicos responsáveis, entre outros crimes, pela prática de homicídio, desaparecimento forçado, abuso de autoridade, lesões corporais, estupro e atentado violento ao pudor contra opositores políticos ao regime militar (1964/1985)". A Procuradoria da República e a AGU deram pareceres para que tudo continue como está.

Se for esta a decisão do STF, o país continuará sendo a solitária exceção a não julgar os criminosos das ditaduras implantadas entre os anos 60 e 70. Julgamentos que tiveram na atuação de Garzón um estímulo fundamental, quando pediu a extradição de Pinochet.

Enquanto aguardamos pelo STF, é uma boa oportunidade para conhecer um pouco mais a respeito do assunto:

1) Sobre o clima de "entendimento" que vivia o país à época, a entrevista do general Newton Cruz, chefe da Agência Central do SNI entre 1977 e 1983 ( a lei é de 1979), no programa Dossiê Globonews de ontem;

2) Sobre os acontecimentos nos períodos imediatamente anterior e posterior à aprovação da lei, a o material disponibilizado pela Folha sobre o governo Figueiredo, publicado à época da eleição de 2002 ( a lei é de agosto de 1979 e o AI-5 tinha sido revogado 8 meses antes, em 31 de dezembro de 1978), destacando-se os atentados promovidos pela linha dura do regime;
- Sobre os atentados à OAB, à Câmara Municipal e a um jornal, no Rio de Janeiro, em agosto de 1980.

3) Sobre como o passado não resolvido se reflete na continuação do uso da tortura no presente, tendo como vítimas os pobres, artigo de Maria Inês Nassif, no Valor;

4) No mesmo sentido, trecho do comunicado da Anistia Internacional, por ocasião da divulgação do Plano Nacional de Direitos Humanos:

O ponto central do novo programa é a importante inclusão do direito à memória e à verdade, com a promessa da formação de uma comissão para apurar e divulgar os crimes contra os direitos humanos cometidos pelo regime militar do país.

A Anistia Internacional afirmou que espera que esta comissão venha a finalmente alinhar o Brasil aos outros países da região, que há muito tempo se esforçam para julgar os responsáveis por crimes como desaparecimento, tortura e execução extrajudicial, assegurando assim que as famílias das vítimas gozem do direito à reparação.

O legado de impunidade de crimes passados contra os direitos humanos perdura nos relatórios diários de mortes causadas pela polícia e casos de tortura que hoje caracterizam o sistema de justiça criminal do Brasil.



5) Trecho do comunicado do Human Rights Watch, de abril do ano passado, logo após decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso da Guerrilha do Araguaia:

(Washington, DC) - O Brasil deve investigar e levar a julgamento as violações aos direitos humanos cometidas durante a ditadura de 1964-1985 após uma decisão judicial histórica, afirmou a Human Rights Watch hoje. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos afirmou que anistias e prescrições não se aplicam a crimes de lesa-humanidade cometidos durante a ditadura militar no Brasil.

A conclusão da comissão, anunciada em 8 de abril de 2009, é a primeira decisão internacional relacionada aos abusos cometidos durante a ditadura militar no Brasil (1964 a 1985). A petição que deu origem à decisão foi enviada por familiares de 70 pessoas desaparecidas durante operações militares contra o movimento comunista de guerrilha do Araguaia nos anos 70.

"O Brasil não promoveu julgamentos e nem mesmo instaurou uma comissão da verdade para apurar os crimes muito graves que foram cometidos, e está atrasado em relação a outros países da região no que diz respeito à responsabilização por abusos do passado", disse José Miguel Vivanco, diretor da divisão das Américas da Human Rights Watch. "Quase um quarto de século já se passou desde a transição para a democracia. As vítimas e suas famílias já esperaram demais por justiça."

6) Trecho de palestra de Noam Chomsky em Stuttgart, na Alemanha, em 23 de março, em tradução minha:

Cuba à parte, a praga do terror de estado no hemisfério ocidental foi iniciada com o golpe brasileiro em 1964, instalando o primeiro de uma série de Estados de Segurança Nacional neonazistas e iniciando a praga da repressão sem precedentes no hemisfério, sempre fortemente apoiada por Washington, e por esta razão uma forma particularmente violenta de terrorismo internacional de direcionamento estatal. A campanha era em grande medida uma guerra contra a Igreja [em função do Concílio Vaticano II, iniciado em 1962]. Foi mais que simbólico que ela tenha culminado com o assassinato de seis destacados intelectuais latino americanos, padres jesuítas, em novembro de 1989, alguns dias após a queda do Muro de Berlim. Eles foram assassinados por um batalhão de elite salvadorenho, recentemente treinado na Escola de Forças Especiais John F. Kennedy , na Carolina do Norte. Como se soube em novembro último, mas aparentemente não despertou interesse nenhum, a ordem para os assassinatos foi assinada pelo chefe de governo e seus assessores, todos eles tão próximos do Pentágono e da Embaixada Americana que se torna ainda mais difícil imaginar que Washinton não tivesse conhecimento dos planos deste batalhão modelo.
7) De Jânio de Freitas, sobre a ameça de demissão dos ministros militares, no início do ano, após a divulgação do Plano Nacional de Direitos Humanos, tratando especificamente da anistia;

8) Trecho de artigo de Luiz Cláudio Cunha, repleto de dados históricos, também sobre a crise do fim do ano passado:

Na antevéspera do Natal, quando já bimbalhavam os sinos, o presidente Lula ouviu em seu gabinete um tropel distante. Não eram as renas do bom velhinho. Era o som metálico dos cascos das montarias de seu ministro da Defesa e dos chefes das Forças Armadas, em marcha batida para emparedar o presidente na mais grave crise militar da República desde 1977, quando o presidente Ernesto Geisel demitiu o então ministro do Exército Sylvio Frota, num gesto implacável e temerário para conter o radicalismo da linha-dura do regime – que no espaço de três meses matou, sob torturas, o jornalista Vladimir Herzog e o operário Manoel Filho no DOI-CODI do II Exército, em São Paulo.

Desta vez ocorre o contrário. Os comandantes militares é que tentam enquadrar o presidente da República, ameaçando uma demissão coletiva contra o decreto presidencial que cria a Comissão Nacional da Verdade, destinada a investigar violações de direitos humanos e casos de tortura durante a ditadura militar (1964-1985).

Durante duas décadas, um aparato repressivo estimado em 24 mil agentes prendeu por razões políticas cerca de 50 mil brasileiros e torturou algo em torno de 20 mil pessoas – três a cada dia.



8) Entrevista com Fábio Konder Comparato, um dos signatários da petição da OAB no STF, à Carta Capital - primeira e segunda partes.

9) Trailer e blog de Guerrilha do Araguaia, as faces ocultas da história, filme de produção goiana, exibido em rede nacional pelo programa DocTV, infelizmente não lançado em DVD.

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