15 fevereiro, 2009

Operação Legalidade: é ilegal, ponto final.



Conduta ilegal e arbitrária


No sábado, dia 31 de janeiro, reportagem de O Popular , Promotor Barra Operação Legalidade em Ceres, revelou que o titular da 2ª Promotoria de Justiça de Ceres, Dr. Marcos Alberto Rios, expedira recomendação no dia anterior para que a PM se abstivesse de iniciar a operação na área de jurisdição daquela promotoria.

A matéria, de Waldineia Ladislau, era bastante completa, como mostra o trecho abaixo:

Em Ceres, Nova Glória e Ipiranga de Goiás, as Polícias Civil e Militar não serão bem-vindas para realizar a Operação Legalidade. É que o promotor de justiça Marcos Alberto Rios, da 2ª Promotoria de Justiça da comarca de Ceres, expediu ontem a Recomendação Técnico Jurídica nº 1/09.

O documento salienta que “os policiais civis e militares se abstenham de efetuar qualquer medida de intimidação ou interdição de estabelecimento comercial, se apenas motivada por ‘ausência de alvará’ ou qualquer outro documento ou atestado de regularidade tributária”.

O promotor de justiça deixa claro, nas considerações que antecedem à recomendação, que os fatos estão sendo amplamente divulgados pela imprensa, sobre a operação deflagrada pela Polícia Militar (PM) para combater bares e restaurantes em funcionamento sem o devido alvará. A ação da PM já resultou no fechamento, desde o dia 15 de janeiro, de mais de 600 estabelecimentos em Goiânia e cidades do entorno da capital.

Abuso de autoridade

No documento, o representante do Ministério Público salienta que, caso a recomendação não seja seguida, tanto pelos mandantes quanto por seus executores, “alternativa não restará a este órgão do Ministério Público estadual a não ser o imediato aparelhamento das devidas persecuções judiciais pelo crime de abuso de autoridade e pela prática de ato de improbidade administrativa.”

Ilícito penal

Para o promotor Marcos Rios, a interdição de estabelecimentos comerciais por apontarem “meras irregularidades administrativas”, como é considerada a falta de alvará de funcionamento, é uma medida extrema. Além do mais, Marcos Rios lembra que segundo estatísticas oficiais, 50% da atividade econômica no País encontra-se na informalidade, “por razões e impedimentos de ordem econômica que extrapolam o âmbito do Direito Penal”.

O texto da recomendação é claro: o promotor classifica a conduta como "ilegal e arbitrária".Uma das considerações feitas, não mencionada na reportagem, é de "que a interdição ilegal de qualquer estabelecimento comercial, por parte da Polícia Militar ou Civil, resultará fatalmente em uma verdadeira “corrida ao Poder Judiciário”, em busca de indenizações e responsabilizações contra o Estado de Goiás, por parte das vítimas ilegalmente despojadas de seu ofício, sem falar no inevitável desprestígio das instituições do Estado":

(para ler em tela cheia, clique no último botão acima da janela com o documento)


Recomendacao de Ceres
Em Goiânia, Ministério Públicou apoiou a conduta

Cinco dias antes, em reunião na Secretaria de Segurança Pública, em Goiânia, a representante do Ministério Público adotara posição diferente. Embora indiretamente confirmasse a ilegalidade ao dizer que a partir daquele momento não havia qualquer senão, avalizou a operação:

A coordenadora do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público, Alice de Almeida Freire, participou da reunião e hipotecou apoio à ação da PM. “Agora, com a parceria da Sedem, não há nenhum senão à operação que está sendo importante para conter a criminalidade”, destacou. A representante do MP também entregou à Sedem um relatório sobre uma proposta de horário de funcionamento dos estabelecimentos, nos moldes da medida que foi implantada em Diadema (SP),onde os bares fecham às 22 horas.


Secretaria de Segurança divulgou uma coisa e fez outra

A Secretaria de Segurança Pública tinha a exata noção de como a operação deveria ser conduzida para ser legal. Basta consultar a nota sobre o seu lançamento no site da SSP-GO , onde está dito que a PM se limitaria a acionar os órgãos responsáveis:

Por meio da operação, que começa hoje, policiais militares vão percorrer bares, lanchonetes e pit dogs conferindo as licenças e autorizações para funcionamento. Em caso de irregularidade, a PM vai acionar os órgãos competentes.

“Se a infração for a falta de um alvará da prefeitura, por exemplo, o município será acionado para que encaminhe seus agentes e feche aquele comércio”, explica Roller. “A PM vai detectar as infrações e fazer o encaminhamento ao órgão competente”, acrescenta.

A diminuição nas ocorrências policiais era prevista pelo Delegado Geral da Polícia Civil, como resultado do enorme efetivo policial que estaria nas ruas:

Para a operação, a Polícia Civil está reforçando o quadro das centrais de flagrante. “Estamos acrescentando um número maior de policiais e de escrivães”, disse o delegado geral Aredes Correia.

“Mas penso que o número de ocorrências deve até diminuir porque a PM está colocando mais de 4,5 mil homens em Goiânia, Anápolis e Aparecida de Goiânia na operação, que é um trabalho preventivo”.

A nota mencionava ainda o apoio de entidades representativas e de prefeituras:


A população pode denunciar estabelecimentos clandestinos por meio do telefone 190. A operação, que conta com a parceria também do Corpo de Bombeiros, tem o apoio de entidades como a Maçonaria, Fecomércio, Sindicato de Bares, Restaurantes e Similares e prefeituras.

Reunião tentou justificar condução da operação

Por alguma razão a operação saiu fora do planejado, caracterizando sua ilegalidade e a polêmica que se seguiu tentando justificá-la.

O ponto culminante foi no dia 25, quando, ainda segundo o site da SSPJ-GO , houve a reunião na qual o MP apoiou a operação. Entre os presentes, além do MP, os mesmos do lançamento da operação (secretário de Segurança Pública e Justiça, Ernesto Roller, o comandante geral da Polícia Militar, coronel Carlos Antônio Elias, o delegado geral da Polícia Civil, Aredes Correia e entidades como Fecomércio e Acieg) mais a OAB. Só naquela data, onze dias após o início da operação, com 600 pontos de comércio em Goiânia fechados, era feito o "encaminhamento ao órgão competente":

Além de apresentar os resultados, o secretário anunciou a segunda etapa da operação, desta vez com a parceria da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico (Sedem), cuja titular, Neyde Aparecida, participou do encontro. Ernesto Roller entregou para ela um relatório com endereços e telefones dos estabelecimentos que estão irregulares para que a prefeitura tome as providências.

Além de fazer um balanço da operação, o Secretário de Segurança tentou justificar a arbitrariedade na sua condução alegando a emergência da situação, confirmando que a execução não correspondeu ao divulgado no dia 15, já que fora feita à revelia das prefeituras:

“As forças da segurança pública agiram de forma emergencial para combater a violência e a criminalidade”, explicou o secretário sobre a ausência da Prefeitura na primeira fase da operação. “O que chamamos agora é para que não só o município de Goiânia participe como também todas as prefeituras, já que a operação alcança todo o Estado”.


Cinco dias depois, no dia 30, sexta-feira, interrompendo suas férias, o Dr. Marcos Alberto Rios encerrou a polêmica ao expedir a recomendação como noticiado por O Popular no dia seguinte.

TAC liberou abertura em Goiânia

O site do Ministério Público só registrou a expedição da recomendação do promotor de Ceres na noite de sexta-feira, dia 6. No mesmo dia, matéria do Diário da Manhã informou que no dia 3 fora assinado um Termo de Ajustamento de conduta pelo MP de Goiânia, liberando provisoriamente o funcionamento dos estabelecimentos que haviam sido fechados:

Alvarás concedidos

Estabelecimentos fechados durante a Operação Legalidade poderão reabrir com alvará de funcionamento provisório concedido pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico – Sedem. A concessão terá validade de 90 dias, até que seja expedido o documento definitivo.

A medida foi viabilizada por meio de Termo de Ajuste de Conduta (TAC) assinado na última terça-feira (3) pelo secretário do Planejamento, Luiz Alberto Gomes de Oliveira, pela secretária de Desenvolvimento Econômico, Neyde Aparecida, pelo presidente da Agência Municipal de Meio Ambiente – Amma, Clarismino Luiz Pereira Júnior, e pelo promotor de Justiça da área de Urbanismo, Maurício Nardini.


Balanço da Operação: particularidades

Um outro aspecto que chama a atenção nas notas divulgadas sobre a operação é a metodologia usada para o cálculo da redução no número de ocorrências, conforme tabela que consta no Site da PM. A tabela (abaixo) , com dados divulgados na reunião do dia 25, mostra o que seria a variação no número de ocorrências nas duas primeiras semanas da operação.

A primeira coluna discrimina as naturezas das ocorrências. A redução na primeira semana da operação (quarta coluna) foi obtida comparando os números de ocorrências na semana em que começou a operação (terceira coluna) com os da semana anteior (segunda coluna). Houve uma redução substancial em todas as modalidades de ocorrências, como previra o Delegado Geral da Polícia Civil no lançamento da operação, em função do enorme contingente policial colocado nas ruas, o que inibiria as ações criminosas.Era de esperar-se, portanto, um progressivo aumento no número de ocorrências, findos os efeitos desse impacto inicial.

No entanto, a tabela mostra o contrário: teria continuado havendo variação negativa nas ocorrências na segunda semana (sétima coluna). Em seis das sete as categorias de ocorrências teria havido redução e a outra ficara estável:


(clique sobre a imagen para ampliá-la)


Um olhar com um pouco mais de atenção mostra que para chegar-se a esse resultado , ao invés de serem comparados os números de ocorrências da segunda semana da operação (sexta coluna) com os da primeira semana, que a antecedeu (terceira coluna) a comparação foi feita, novamente, em relação aos números da semana anterior ao início da operação ( repetidos na quinta coluna).

Contudo, quando a variação é calculada relação à primeira semana, muda quase tudo: houve aumento em quatro das naturezas de ocorrências (numa, de 400%), uma ficou estável e somente nas outras duas houve redução (homicídios e furto a estabelecimento comercial). O total de ocorrências, ao contrário de reduzir-se em 31%, aumentou 7%. Ou seja, como esperado, após o impacto inicial, os números aumentaram. A tabela e o gráfico abaixo, elaborados usando os dados da tabela divulgada, mostram isso:

(clique sobre as imagens para ampliá-las)

Tabela - variação semanal no número de ocorrências policiais
verde - redução; vermelho - aumento; preto - estável




Questões a serem respondidas

Sobre os resultados da operação, o que aconteceu nas semanas seguintes? Continuou havendo aumento no número de ocorrências? Há outra peculiaridade nos dados divulgados: eles se referem a apenas 4 dias da semana (quinta a domingo). Para a correta avaliação dos resultado da operação é preciso que a Secretaria de Segurança Pública divulgue os dados completos, de todos os dias da semana, de todas as semans, bem como dados de anos anteriores.

É preciso também explicar a origem da divergência entre a operação planejada, divulgada pela cúpula da Segurança Pública no estado e o que foi executado, tendo em vista a gravidade da situação em termos legais, suas possíveis repercussões e o número de atingidos, como bem esclareceu o Dr. Marcos Rios em sua recomendação.

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