Confira, abaixo, a pergunta que formulei a Rodrigo Pimentel no Face a Face, publicado na edição de ontem (25/12), de O Popular, sobre a legalização das drogas.
Reproduzi a pergunta original, feita no Facebook, a versão editada pelo jornal e a resposta de Pimentel, e, logo depois, trecho da entrevista dele à revista TRIP, edição de outubro de 2009, em que trata do mesmo assunto com mais detalhe.
(veja também os dois artigos posteriores, publicados em conjunto com este)
Facebook: No debate você se disse a favor da legalização das drogas e que esta sua posição mudou ao longo do tempo, usando a expressão "enxugar gelo". No mundo todo se defende essa nova abordagem, de se superar a política de "Guerra às Drogas" tratando a quetão, em termos de política pública, no âmbito da saúde e não criminal. A revista Economist, por exemplo, que não tem nada de esquerdista, o faz há mais de dez anos.Nos Estados Unidos, ex-chefes de grandes departamentos de polícia o fazem. Como vê o debate da questão no Brasil, considerando os 13 anos que já se passaram desde que deu seu depoimento para o filme "Notícias de uma Guerra Particular" ? (quinta às 08:32)
(Marcus Fidélis) - No debate realizado em Goiânia, você disse ser a favor da legalização das drogas e que essa sua posição mudou ao longo do tempo. No mundo todo, a política de guerras as drogas tem mudado, tratando a questão mais no âmbito da saúde do que no âmbito criminal. Como vê o debate da questão no Brasil, considerando os 13 anos que já se passaram desde que você deu seu depoimento para o filme Notícias de Uma Guerra Particular?
Na verdade, a política de guerra continua no mundo todo. No Brasil, metade dos presos cumpre pena por tráfico de drogas e esta realidade é a mesma na América do Norte e na Europa. O número de presos por tráfico cresce em velocidade superior ao de presos por crime de roubo ou furto. A ideia de tratar a questão das drogas como questão de saúde pública ainda é muito recente no Brasil. Oficialmente é de 2005 o texto da Política Nacional sobre Drogas, que garante o acesso a tratamento de saúde para todo dependente de drogas lícitas ou ilícitas. Com a avalanche do crack, com mais de um milhão de usuários no País e com seus efeitos devastadores à saúde, a questão do tratamento teve de ser trazida ao debate nacional. O crack deixa de ser um problema de segurança pública para ser um tragédia de saúde pública e certamente não existe ainda capacidade de internação ou de tratamento adequado para tanta gente.
Entrevista -Fogo Cruzado - Páginas Negras, Trip 182, outubro de 2009.
O Verdadeiro Capitão Nascimento Fala com Luiz Alberto Mendes, mais de 31 anos de cadeia.
(...)
Hoje é mais comum ver bandidos na classe média. você tem medo de seu filho virar bandido?
Pimentel: Tenho, é uma preocupação. No Rio acontece muito. Já prendi o filho de um militar que era motorista do tráfico. Isso começa nos condomínios fechados, no grupo da maconha, apesar de eu ser a favor da legalização. Depois, começam pequenos furtos dentro do condomínio. Evolui para venda de ecstasy, para espancar doméstica em ponto de ônibus e assim por diante. Essas gangues são típicas dos condomínios, de jovens que foram criados sem andar de ônibus, sem conhecer a rua, sem conhecer nenhum valor.
A solução é legalizar a maconha e proibir os condomínios.
Pimentel: [Risos] Nos condomínios você tem esse tipo de marginalidade. Na favela, é outro tipo: é o garoto sem opção de porra nenhuma.
....
Por que a operação deu errado, com a refém morta pela polícia e o sequestrador executado depois de preso?
Pimentel: O policial não tava pensando em salvar a vida da refém, mas em matar o bandido. De forma geral, o policial brasileiro não quer fazer segurança pública, quer prender ou matar bandidos. E, quando você coloca alguém em risco pra isso, não está fazendo segurança pública.
Mendes: Admiro o que você tá falando, é exatamente o que gostaria que a polícia fosse.
Pimentel: No Ônibus 174, fomos acusados de defender o [sequestrador] Sandro, de transformar bandido em herói. No Tropa de elite, disseram que a gente era fascista.
Mendes: Acontece que o Tropa de elite coloca a culpa no usuário, no rapaz da universidade que fuma o baseadinho. Em nenhum momento o filme acusa os financiadores da droga, o esquema que está por trás de tudo.
Pimentel: Era a visão de um capitão da polícia com 27 anos de idade.
Mendes: Não combina com o que você tá falando.
Pimentel: Em algum momento, foi a minha visão. O Bope até ajudou a mudar isso. O filme é simplista, o Capitão Nascimento é simplista. Foi aplaudido por gente de todas as condições sociais, “finalmente alguém falou que a culpa é do usuário”. Pobre é até mais conservador que rico. Há um consenso de que a porrada funciona, mas a violência urbana tem a ver com várias coisas, como desemprego e desigualdade social. Mas é bom deixar claro que quem fuma maconha compra essa merda de alguém que estabelece uma ditadura armada na favela ou na periferia.
Qual a solução?
Pimentel: Legalizar.
Mendes: Legalizar acaba com os traficantes.
Legalizar a maconha ou as drogas em geral?
Pimentel: Vamos lá. Foi um processo lento para eu entender que a maconha não era o Satã. Lembro de uma festa que fui com minha mulher, uma formatura da Fundação Getúlio Vargas, e tinha uns dez casais fumando maconha. E eu no dia seguinte ia botar roupa preta e matar quem tava vendendo aquela porra. Num processo de amadurecimento, entendi que tinha que legalizar, que matar traficante era um desperdício de tempo e de dinheiro público.
Mas, se as outras drogas continuam ilegais, o tráfico sobrevive.
Pimentel: É uma falsa solução. Mas só por defender a legalização da maconha já tomo vaia. E não prenderia o usuário de cocaína, iria atrás dos chefões. A repressão é cínica, só prende pobre. Em Chicago, o foco da repressão são o médio e o grande traficantes. Talvez seja um caminho.
Mendes: Eu acredito na liberação. Prender o usuário não resolve.
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