05 agosto, 2009

É tudo mentira

Consegui localizar Adalto Alves e pedi que fizesse um breve comentário sobre a polêmica da crítica. Recebi um belo conto (abaixo) , no melhor estilo do Mino Carta de O Castelo de Âmbar.


É uma honra publicá-lo, assim como foi anteriormente com os artigos de José Antônio Tietzmann e Silva e Haroldo Caetano.



É tudo mentira

- conto –

Adalto Alves

“Qualquer semelhança com a realidade é apenas fantasia, urdida por quem fantasiou a semelhança.”

Ataulfo tinha um programa de música na Rádio dos Executivos. Ele assinava contratos, a cada três meses, para não criar vínculos empregatícios, segundo Lampadinha, um dos diretores da Rádio. A recompensa financeira de Ataulfo, que produzia e apresentava o programa, poderia ser obtida através de uma cota de patrocínio que ele jamais conseguiu vender. Como também colaborava, esporadicamente, com críticas musicais, para o jornal O Aristocrata, Ataulfo decidiu abandonar a emissora, assim que foi convidado a exercer a atividade, remunerada, de crítico no segundo caderno do periódico, o Regabofe.

Antes de assumir o lugar de Bião Eucalipto, transferido para o jornal da cidade de Vaias, Ataulfo sentou-se com as cabeças pensantes do jornal, Mileide Caldas e Carlota Joaquina. Como Ataulfo não era formado em Jornalismo (estudara os Cabeças de Vento na faculdade), não poderia ser contratado pela empresa. Atuaria como simples colaborador. Mileide foi incisiva ao afirmar que não queria um crítico forjado nos releases das gravadoras. A independência e o salário depositado na conta todo mês, de acordo com tantas resenhas por semana, sem precisar freqüentar a redação, deixaram Ataulfo satisfeito com sua nova conquista.

As portas da Rádio ainda não estavam fechadas. Apesar do fracasso empresarial, por assim dizer, o programa tinha boa aceitação e servia como carimbo de prestígio no horário. Ataulfo se dispôs a procurar, com um amigo desinteressado, um patrocinador que garantisse a recolocação do programa no ar. Seria o paraíso. Enquanto isso, ele começou a produzir resenhas para o jornal.

A primeira diatribe surgiu depois de uma crítica endereçada ao intérprete Castelo Marra, que acabara de lançar o CD Condomínio Fechado. Não que alguém tivesse dito alguma coisa a Ataulfo, mas ele sentiu um clima de certo desconforto na atmosfera ao seu redor. Passado algum tempo, o jornal publicou, na capa do Regabofe de domingo, uma crítica de Ataulfo sobre o novo disco de Cagliosto Soraes. Uma crítica não muito simpática, diga-se de passagem. Foi a gota d´água de um copo muito raso.

Na quinta-feira subseqüente, quando foi entregar material à Carlota Joaquina, ouviu dela o veredito: a família Soraes havia pressionado a direção do jornal para que ele fosse afastado. Soraes, casado com a famosa atriz parisiense Tróia Pirex, nega tudo com os pés juntos. Mas o fato é que Ataulfo foi afastado de suas funções, assumidas, logo depois, pelo alemão Gledson Wunder. O mais engraçado é que, ao procurar a Rádio dos Executivos, para retomar a produção do programa, Ataulfo ouviu de Lampadinha que a emissora já tinha ocupado o espaço com uma nova atração.

O triste remédio para Ataulfo foi voltar a trabalhar na revista do Semanário da Tarde, de onde havia saído para nunca mais voltar.

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