É evidente, como sabem os leitores do blog, que a situação só piorou desde que, há um ano, fiz um estudo detalhado do resultado então divulgado (Retrocesso e Ilegalidades no Resultado da Lei Municipal de Incentivo à Cultura) . Basta clicar sobre o marcador Lei de Incentivo à Cultura, no final deste texto para ver tudo que escrevi a respeito.
Por ora, registro apenas que o único resultado prático do atraso na constituição da comissão causado pelas mudanças na legislação foi a redução no prazo de seleção, dos 90 dias regulamentares para menos de 30, já que o decreto com a nomeação dos membros da comissão foi publicado na edição do dia 14.08 do Diário Oficial do Município e há um lapso de cerca de 7 dias entre esta data e sua circulação. Ou seja, a publicidade efetiva do decreto, e sua validade, só deve ter ocorrido após o dia 20 de agosto (na sexta-feira, dia 17, circulou a edição do dia 09.08) e caso tenha havido reuniões antes disso elas foram ilegais.
Além disso, conforme antecipado na matéria de Edson Wander (leia abaixo), a professora Andrea Teixeira não aceitou sua nomeação, reduzindo para 10 os membros, desfalcados de Beto Leão, que segundo consta esteve internado, totalizando 9 integrantes, dos quais 6 (2/3) funcionários da Prefeitura, a maioria sem qualquer atuação na área cultural, proporção que terá sido ainda mais elevada caso algum dos outros 3 membros tenha faltado a alguma reunião (limitadas, com remuneração, a 10 a cada 30 dias).
Mau cheiro da cultura
Criada e instituída na administração do prefeito Pedro Wilson, a Lei Municipal de Cultura tem sido uma das alavancas da produção cultural goianiense. Perspicaz, a atual administração não só a manteve em pleno funcionamento, percebendo de imediato a sua importância, como também tratou de lhe dar maior divulgação.
Mas a perspicácia não parou por aí. Tão logo assumiu, o novo secretário de Cultura tratou de podar as asas do conselho de análise dos projetos, retirando-lhe, de uma só vez, o caráter autônomo que o distinguia e a representatividade que o caracterizava. É mais um caso patente em que a perspicácia passa de mocinha à vilã, se manifestando em excesso a ponto de exceder-se e virar esperteza. E se é correto o dito que onde há fumaça sempre encontramos fogo, onde ele teria se camuflado, então?
Eis que da fumaça alardeada pelas entidades representativas dos diversos segmentos da cultura goianiense, opondo-se ao novo dirigismo municipal, saltam agora as labaredas que nos atingem a olhos nus, sem quaisquer pudores. Para constatar seu furor, basta examinar o resultado e o processo em que se deu o último edital de seleção da lei, divulgado nesta semana.
Muitos me perguntariam porque escrevo este artigo, já que um dos projetos aprovados trata exatamente da reedição do livro Conhecer Confaloni, prêmio de monografia de minha autoria, editado originalmente pela UCG. Pois eu respondo desde já.
Definitivamente, não podemos compactuar quando a esperteza insiste em fugir do controle do bom senso para ameaçar não somente o bom funcionamento da referida lei como também sua própria existência.
Mais que falar, os fatos gritam por eles mesmos. Haja ouvidos, por exemplo, para o segmento das artes plásticas, que expressa seu descontentamento pelo fato de não ter um único representante na comissão.
Haja ouvidos, também, para o setor das artes cênicas, que, ainda travando um desigual embate judicial com essa secretaria – em que espera resguardar seus direitos –, se vê agora obrigado a engolir um “legítimo representante” que fora deslocado às pressas da área de música, sem mencionar sua condição de dublê de agente civil ao mesmo tempo que funcionário da mesma secretaria.
Ouvidos doendo? Pois há mais coisas que crescem orquestradas do adubo que medra na Secretaria Municipal de Cultura de Goiânia. E quem haverá de velar por nós se não o Ministério Público?
Consta que, da lista dos projetos recém contemplados pela seleção do edital municipal, nada menos que seis deles têm ligação direta ou menos direta, mas todas evidentes, com um diretor da mesma secretaria, ao que parece, co-responsável por conduzir e formular na surdina pública cada edição do edital.
Sob a rubrica de “outras manifestações culturais”, foram estranhamente contempladas algumas entidades de caráter estritamente religioso, sejam editoras, produtoras e mesmo igrejas. E como se não bastasse esse desvio de natureza e funções, uma igreja (aprovada!) é a mesma que, em sua TV, apresenta um programa por ninguém menos que o próprio presidente da comissão de análise e citado diretor da mesma secretaria de Cultura.
E não é só. Dois outros projetos (aprovado! aprovado!) contemplam a estagiária do referido programa (R$ 21 mil) e a empresa onde o mesmo programa é editado (R$ 20 mil). Convenhamos, é mesmo muito ibope!
Vale lembrar que, ao contrário do que acontece em outras leis de incentivo, ter um projeto aprovado por este edital representa dinheiro vivo para sua realização, pois o financiamento vem de forma direta do ISS e do IPTU do contribuinte municipal. O agravante, todos podem perceber, é que o mau uso dessa lei tão bem-vinda para o setor cultural poderá abrir caminho para que a Câmara dos Vereadores crie obstáculos para seu funcionamento, que, ano a ano, tem sido mantido graças a muito esforço e mobilização do setor nas horas certas e incertas.
Por isso, queremos crer que, muito embora enfraquecido no aspecto moral por fatos ainda recentes que o levaram a ser citado à guisa de desvio de autoria no seu pretenso trabalho de tese apresentado a uma universidade, entre outros, esperamos que, mesmo assim, o secretário atual de Cultura municipal não decline de vez da sensatez e da conduta transparente que deve ter todo administrador público.
Não são somente os tão falados recursos públicos que estão em questão, mas também a gestão do nosso capital social, de onde brota a esperança coletiva, que é a primeira a ser atingida quando fatos assim vêm à tona. Ao lesar o erário, o administrador público está também lesando a moral e a auto-estima do cidadão, seja ele produtor ou consumidor de cultura.
O País está emporcalhado demais para que mais esse sacrifício da transparência e isenção públicas seja-nos imposto, dessa vez, sangrando no meio dos produtores culturais, mas atingindo toda a sociedade. Em última estância e se necessário for, sabemos que o insigne prefeito dessa cidade, sr. Iris Rezende, não permitirá que este ato seja sacramentado. De nossa parte, não podemos aturar que o mau cheiro que até agora recendia da praça nacional passe a recender também do nosso quintal.
PX Silveira
documentarista
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Meu caro e sempre batalhador Marcus, dessa vez, a coisa foi longe demais. Ou a turma se mobiliza e age, ou assumem de vez que estão dizendo amém as desmandos oficiais da SECULT.
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